Menina dorminhoca

Rosângela Trajano

Para Luciene Avanzini, minha Lu que gosta de dormir

1

Uma vez uma menina

Dormia mais um tantinho

Tanto dormiu que esqueceu

De cuidar do seu gatinho

2

A menina dorminhoca

Gostava de cochilar

Roncava igual uma onça

Não tinha certo lugar

3

Usava lacinho azul

Vestido com uns retalhos

Sapatos avermelhados

Pegavam outros atalhos

4

Quando dormia sonhava

Outros mundos mais bonitos

Com montanhas e com lagos

Nunca antes por ela vistos

5

Nunca queria acordar

Do seu gostoso soninho

Olhos fechados andava

Puxando o leal gatinho

6

Muitas das vezes sonhava

Numa árvore subindo

Falando com Iracema

Acabava era dormindo

7

Dorminhoca era chamada

Andava meio tristonha

Não saía mais de casa

Nem visitava mais Tonha

8

Dormia com nove livros

Em cima da sua cara

Sonhava com as bonecas

Aquelas que desejara

9

Dorminhoca não podia

Dirigir carro de mão

Nem tirou sua carteira

Reprovada na lição

10

Era dia de um exame

Que via na barriguinha

Como era tudo por dentro

Dormiu aberta boquinha

11

Pediu aquele bom médico

Profissional gentil

Um remédio pra curar

Seu soninho pueril

12

Igual as demais crianças

Dormir mais só um pouquinho

A noite inteira sonhar

Com girafas, dragõezinhos…

13

O médico achou uma graça

O pedido da menina

Não podia fazer nada

Pela bela pequenina

14

À tarde foi comprar pão

Para comer com café

Dormiu devagarzinho

Com a cabeça no pé

15

Teve uma ideia legal

Morar no sono do dia

De noite muito brincar

Ser verso de poesia

16

As amigas reclamavam

Dela somente dormir

Sem saber o que fazer

Para elas nunca fingir

17

Visitou bom curandeiro

Que a benzeu com fé e reza

Nada de preocupar

É coisa que se despreza

18

Mesmo assim o curandeiro

Quis um xarope passar

Para tomar a menina

Preocupação sarar

19

Com suas três moedinhas

Xarope logo comprou

Quis um gostoso sorvete

Seu dinheirinho acabou

20

Era noite e ao voltar

Para a sua moradia

Que ficava nas montanhas

Lá onde o dia nascia

21

A menina ali sentou

Na varandinha da casa

Olhou para o céu azul

Olhinhos cheios de brasa

22

Perguntou triste, baixinho

A Deus com todo cuidado

O que fazer com o sono

Onde melhor ser guardado

23

Deus gritou forte do céu

Assustou muito a menina

Correu pra dentro de casa

Rápida fechou a cortina

24

Foi um tremendo trovão

Com ele uma chuva veio

Ficou frio na montanha

Raio na casa do meio

25

Trocou logo de vestido

Acendeu uma lamparina

A vovó tinha saído

Gato dentro da botina

26

Chuva falava lá fora

Pegou velha revistinha

Começou sentada a ler

De frente à janelinha

27

Num sono profundamente

Revista em cima da cara

Gato com medo chamando

Ela pra ver pau-de-arara

28

Era vovó já chegando

Da feira toda molhada

Trazia bons pimentões

E uma gostosa cocada

29

Vovó a porta empurrou

Com cuidado, devagar

Não acordar a netinha

Dorminhoca do seu amar

30

O gato sentiu o cheiro

De peixe fresquinho, morto

E miava sem parar

Ela só no seu conforto

31

Vovó fez leite quentinho

Para o seu gato faminto

Mas ele não quis comer

Parecia mais um pinto

32

Vovó cantou muito forte

Bateu na sua panela

Quis acordar a menina

Podia cantar naquela

Tarde o tempo que quisesse

Ninguém acordaria ela

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Rosângela Trajano

Em 07 de novembro de 2019

Tarde de primavera, mamãe

Lava roupa no quintal.