Para onde estão indo as crianças?

Rosângela Trajano

Todos sabemos de onde vêm as crianças. Mas algum de nós já perguntou para onde elas estão indo nestes tempos de laços frágeis e brinquedos descartáveis? Parece que essa é uma pergunta ainda pouco debatida nas salas de aulas e nos congressos sobre a infância.

Vivemos um mundo de laços frágeis, que se desfazem tão rapidamente quanto começam, e as crianças não estão fora desse mundo, pois junto conosco convivem nesse mesmo mundo de fragilidades. Não podemos prever para onde estão indo as crianças se não prestarmos atenção em suas atitudes, gestos, emoções, sentimentos e, principalmente, formas de brincar. As crianças querem ser ouvidas e ouvir o mundo ao seu redor. Somos o mundo para elas e precisamos fazer barulho para que nos ouçam.

Para onde estão indo as crianças? Uma pergunta a ser feita por e para cada um de nós que amamos e cuidamos da infância. As nossas crianças estão sujeitas às fragilidades do mundo contemporâneo, seja nas amizades que rapidamente se desfazem, no lugarzinho onde moram e do qual repentinamente se mudam, no brinquedo que se quebra e de imediato é jogado no lixo, na roupa que, por um furinho, é retirada do guarda-roupa.

As crianças gostam de cheirar um paninho para dormir à noite… Por quê, então, tirar esse paninho delas? Deixem que o paninho, sob os cuidados da criança, fique bem velhinho. Não que as crianças precisem de uma redoma, isso não. As crianças sabem como se proteger, mas elas precisam de cuidados especiais para que não se tornem individualistas a ponto de se esquecerem do amor ao próximo e dos cuidados com as suas coisinhas.

Sim, as crianças precisam aprender a se cuidar. Um cuidado que cada um de nós deve desenvolver desde a tenra idade, para, mais tarde, não sofrer dentro de uma sociedade líquida em que as pessoas não se prendem a nada mais, nem mesmo aos laços afetivos.

Somos adultos e muitos de nós sofremos com a ligeireza das informações que nos chegam a todo momento, com a rapidez com a qual as pessoas falam conosco, com a subida e a descida da ladeira do esquecimento. Estamos num mundo onde é considerado o melhor aquele que sabe ser rápido e perderia espaço nesse lugar a tartaruga com seus passinhos frágeis diante da imensidão do mar.

Para onde estão indo as crianças que vivem presas em edifícios cheios de grades, as crianças que não brincam mais em campinhos, as crianças que têm nas mãos o tempo todo um celular ou um tablet para jogos eletrônicos? Assim são as crianças do nosso mundo líquido. Penso que as crianças podem tomar vários caminhos nesse mundo da rapidez, mas temo que esses caminhos sejam os de se tornarem robotizadas e individualistas demais a ponto de se esquecerem de pintar estrelas e de colher cajus nas manhãs de primavera.

Não há nada que possa tirar da criança o prazer de tomar um banho de chuva, apenas o constante hábito de estar à frente da tela de um celular. Qual criança antigamente perderia um banho de chuva? Qual criança nos dias atuais toma banho de chuva? As crianças estão indo para o lugar dos adultos, deixando de ser crianças antes da idade necessária a sua alma e fazendo coisas de gente grande. Temo que as crianças encontrem caminhos de adultos individualistas e sem amor a si próprios.

Que possamos rabiscar os caminhos das nossas crianças através de lápis colorido, pintando à mão o cuidado consigo, o amor ao próximo, o zelo ao meio ambiente e ao mundo ao seu redor. E para que as crianças sigam para lugares com caminhos bordados por chocolates de pensares que se alternam entre o bem-querer e o desejo de competir, preocupando-se com o próximo, faz-se necessário que criemos laços afetivos duradouros e resistentes, porque não devemos ser egoístas e querermos para as nossas crianças o mesmo mundo em que vivemos, pois elas não são merecedoras de uma vida e de amor líquidos por encurtamento dos tempos da velha infância.

Façamos com que as crianças apreciem o mundo desenhado pelas suas próprias mãos e que elas possam amar incondicionalmente e ser amadas, também. Para onde estão indo as crianças? Acho que vão ver uma casinha de formiga. Assim seja.