Rosângela Trajano
O menino louro
O menino louro
Não tinha amigo
Era uma minhoca
Que andava consigo
Sem nada ter
Eu lhes digo.
Num domingo
De chuva fina
Ele pegou uma ave
Que veio da China
Com febre alta
Deu pra ela aspirina.
O menino louro
Brincava de ser
Qualquer coisa
Menos fazer
Do seu pensamento
O esquecer.
O menino louro
Era soldado
Defendia a pátria
Por todos aclamado
Chapéu na cabeça
Dedo levantado.
O menino louro
Corria sem parar
Nunca cansava
Vivia para afastar
O medo de lá
Distante caminhar.
O menino louro
Era analfabeto
O a-bê-cê não sabia
Seu nome Beto
Não escrevia
Era Beto, o Neto.
O menino louro
Tinha vergonha
De se ver no espelho
A cara na fronha
Os pés no chão
Olhar de quem sonha.
O menino louro
Fazia buracos
Negros e profundos
Nos panos de saco
Ratos do bem
Colhiam seus cacos.
O menino louro
Juntou dinheiro
Mas o ladrão
Levou o mealheiro
Veio o choro
De triste verdadeiro.
O menino louro
Caiu doente
Sem remédios
Com febre quente
Tomou injeção
Que acidente!
O menino louro
Levou um tombo
Perto de casa
No chão o lombo
Ficou dolorido
E com um catombo.
O menino louro
Jogava futebol
Num campinho
Perto da árvore
Ele e a bola
Às vezes basquetebol.
O menino louro
Magrinho coitado
Não tinha pai
Era abastardo
De amor de mãe
Em jogo apostado.
O menino louro
Vendia laranjas
Ao povo da rua
Cuidava das granjas
Dos grandes senhores
Comedores de canjas.
O menino louro
Perdia tudo
Até os pés
E muito sortudo
Achou um escudo.
O menino louro
Brincava de pular
Pulava da ponte
Para apavorar
O susto do povo
Mais aprontar.